O Autor em 1973 Nome Leão Verde Localização Norte de Portugal Ver o meu perfil completo Música Angolana
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sexta-feira, 26 de novembro de 2010 Expulso [ II/II ]Segunda-Feira, 21 de Novembro Dirijo-me para o meu local de trabalho e verifico que as portas se encontram acorrentadas e cadeadas e soldados das FAPLA armados a impedir qualquer proximidade às mesmas. O banco estava “selado”. Não pudemos entrar para trabalhar ou retirar o que lá tínhamos deixado de pertences próprios, nem efectuar qualquer operação de levantamento, pois as nossas contas tinham sido congeladas. Ou seja, nem para o bilhete de avião tínhamos "kumbu", pois apesar da ordem de expulsão a mesma não significava que o governo da R.P.A. tivesse “reservado” lugares para nós no avião de terça-feira. Só mesmo de loucos, pelo ridículo da situação; expulsos, sem kwanzas (a nova moeda angolana) e tínhamos que comprar os bilhetes. Parecia uma situação surrealista, mas era, infelizmente, verdadeiramente real. Nós tínhamos que “ajudar” o governo de Angola a expulsar-nos, comprando os bilhetes, mesmo não tendo dinheiro. Nem em filmes de loucura cómica tinha alguma vez visto cena idêntica à que nos estava a ser apresentada. Conforme estabelecido na reunião de Domingo e face ao que nos estava a acontecer dirigimo-nos à embaixada de Portugal, sita no Miramar, a fim de junto do embaixador o informarmos do que se estava a passar e da solução a dar à problemática verificada. O embaixador informou já ser conhecedor do Decreto e nada poder fazer para alterar o quadro existente, uma vez que o governo de Angola é soberano e responsável pelas suas próprias decisões. Falamos da situação criada, dos bens que cada um possuía e do pouco tempo dado para se poder fazer algo, assim como de alguns de nós nem dinheiro tínhamos para adquirir os bilhetes, isto é, nem nos podíamos expulsar. Sobre os bens móveis ou imóveis o embaixador disse que o que poderia fazer era depois conversar com os governantes angolanos e tentar que esses bens ficassem à guarda do governo para uma posterior solução, mas parecia-lhe ser uma tarefa bastante difícil de concretizar por as relações bilaterais (Portugal/Angola) ainda não estarem bem solidificadas e também pela força do disposto no Decreto de Lopo do Nascimento, que não dava margem para coisa alguma. Quanto aos bilhetes a embaixada daria o dinheiro a quem não o tivesse para os comprarem. Ainda falamos do dinheiro das nossas contas, do facto do banco estar guardado pelos FAPLA e estarmos impedidos de entrar nas instalações para podermos trazer objectos pessoais lá deixados no Sábado (à data ainda se trabalhava aos Sábados até às 12H00 ou 12H30). Mas era obvio que nada havia ou se podia fazer. Compreendíamos que por muita vontade que o embaixador tivesse nada mais podia acrescer ao que já tinha dito sobre o que poderia tentar fazer em relação apenas aos bens móveis e imóveis. Que estava ao nosso dispor para o que fosse necessário e que na terça-feira (dia seguinte) estaria no aeroporto a acompanhar a nossa saída de Angola. Lamentava, mas … Terça-Feira, 22 de Novembro Aeroporto de Luanda. Com o bilhete de voo (o custo total foi de 12.379,90 kwanzas, pago pela embaixada), o passaporte (tinha-o tirado em 1976 para ir a Portugal ao casamento de dois dos meus irmãos) e um saco com alguma roupa, passei a polícia de fronteira. Carimbaram e confiscaram-me o passaporte. Surpreendido mandei “vir” mas o passaporte ficou mesmo. É capaz de mais tarde ter servido para alguém ter “basado” de Angola, trocando a minha foto pela dele. É histórico este tipo de procedimentos. De seguida fui para a revista “geral” e para espanto de todos nós em vez de nos dirigirmos para a pista onde estava o avião, fomos conduzidos para a chamada sala “vip” do tempo “colonial”. Desconhecendo a razão de tal “deslocação” apareceu um branco chamado Lima, acompanhado de dois negros, dizendo serem da DISA (Direcção de Informação e Segurança de Angola), a nova PIDE agora do governo angolano. Principal objectivo foi o de nos provocarem e de provocação em provocação lá nos foram “moendo” o juízo até à espinal medula. Já tinha os neurónios à flor da pele. No avião já se encontravam alguns familiares de companheiros retidos naquela sala, sem saberem o que é que nos estava a acontecer. A angústia começou a apoderar-se dos colegas desses familiares e a pressão dos insultos era já insustentável. Os insultos e chacota continuavam e nós sem sabermos o que é que eles realmente pretendiam. Pensei até que estavam “janados” mas finalmente disseram ao que iam. Queriam saber aonde ou a quem tínhamos deixado todos os nossos bens, carros e outros, pois os mesmos pertenciam a Angola e assim sendo ao povo angolano, que eles representavam :)). E “sacaram” de uma lista com os nossos nomes perguntando a cada um pelos bens deixados e se entre o dia de conhecimento da expulsão e aquele dia de embarque os tínhamos dado a alguém e, se sim, a quem, a fim de os irem confiscar. Sábado, 26 de Novembro Desembarco em Lisboa Tinham decorrido 4 LONGOS dias depois de ter passado pela polícia de fronteira do aeroporto de Luanda, ter ficado sem passaporte e de ter estado na sala “vip”. Naquela sala, dia 22, “ajudei à missa” pois após terem dito ao que iam explodi e chamei-lhes tudo quanto nesse momento me ia na alma. Não pensei nas consequências do que me poderia acontecer ou aos meus companheiros. Foi “disparar” até se acabarem as “balas”. Após essa minha explosão eu e mais doze ou treze companheiros fomos “escolhidos” para ficarmos, enquanto aos restantes foi dada autorização para embarcarem. Nós, os que ficamos nem queriamos acreditar no que estava a acontecer. Vimos os nossos companheiros a atravessarem a plataforma da pista, entrarem no avião e algum tempo depois o mesmo a descolar rumo a Portugal. E nós ali especados, incrédulos até sermos conduzidos através de uma porta lateral da sala “vip” para dentro de uma carrinha fechada VW. Como se criminosos fossemos e com dois deles de armas a nós apontadas fomos para o apartamento do colega Helder Mauricio, sito no Largo das Ingombotas, por ser o que teria mais espaço para ficarmos “devidamente instalados”. Entretanto e ainda na sala “vip” os da DISA disseram aos que embarcaram para não prestarem informações sobre nós quando chegassem ao aeroporto de Lisboa, pois tinham lá informadores e se dissessem alguma coisa corriam o risco de serem responsáveis pelo que nos pudesse acontecer em Luanda. Conclusão; nós éramos reféns, ninguém sabia onde estávamos, nem sequer se sabia se aqueles malfeitores eram realmente da DISA ou sendo, se não estariam a “trabalhar por conta própria". Foram longos dias de incertezas, de desesperanças, de descoordenada complexidade mental, moral e psíquica. E repentinamente também regressei a alguns tempos da vida militar, pois durante aqueles quatro dias estivemos a rações de combate trazidas por aquele bando de malfeitores. Entre o dia 22 e dia 26 vasculharam as casas e os locais onde estariam os nossos bens. Soube, mais tarde, já em Portugal, que em nome do povo angolano os roubaram ao povo angolano, pois muitos de nós tínhamos dado os nossos haveres, carros e chaves das residências a colegas e amigos angolanos, e a eles foram esses haveres retirados. Ao fim desses quatro "longos" dias fomos conduzidos directamente para o avião, tendo sido introduzidos “clandestinamente” pois já “havíamos embarcado” para Portugal no passado dia 22. Nesse dia, 26 de Novembro de 1977 (Sábado), abracei minha mulher, vi e beijei pela primeira vez meu filho, nascido a 4 de Outubro. A todos os companheiros que permaneceram em Angola até à ordem de Expulsão e particularmente aos que comigo ficaram como reféns, um grande abraço de amizade. Saudações e Inté
Comments:
Estes relatos fazem toda a diferença dos relatos de muitos joaquins furtados que se embandeiram defensores da história... a verdadeira história é feita de histórias como esta, mas ninguém quer saber... só houve heróis do lado deles...
Meu querido amigo muito me honra poder dizer e sentir que me considera sua amiga pois vivências como a sua engrandeceram todos os que sentiram na pele o desespero do abandono e incúria dos nossos governantes, agora também grandes heróis nacionais. Dói lembrar, mas é imperioso não deixar esquecer. Um grande abraço Célia Cunha
Olá Célia,
tal como escrevi na resposta anterior ao meu mano, estes meus relatos não têm qualquer outro propósito que não sejam o de deixar neste meu blog escritos das minhas vivências que a qualquer momento me recorde e queira partilhar. São momentos da m/vida e que vão de encontro àquilo que pensei escrever quando construí o "Reviver Estórias". Assim e sobre este tema e sem querer "desenterrar" o passado, irei escrevendo algumas passagens da minha história passada no "Outro Lado do Tempo". E posso dizer, que a exemplo de muitos de nós, e neste género de estórias, tenho mais que muitas para contar. No fundo sempre foram dois anos após a independência e posso dizer-lhe que não andei a "assobiar para o lado". Estive preso/detido durante horas pelo MPLA; percorri, debaixo de balas, a Avª Brasil a caminho do Hospital de S. Paulo transportando familiares e amigos feridos; estive nas filas que se começavam a formar a partir das dez da noite em redor do Jumbo para no dia seguinte, aquando da abertura, ter a possibilidade de comprar alguns alimentos; no primeiro dia de independência (11.11.75) estava às 08h30/09H00 no Bo. do Cazenga à procura de água; o 27.05.77 (intentona de Nito Alves) sei como o passei e muitos outros momentos que marcaram aqueles dois anos até à data de expulsão. Por isso Joaquim Furtado, Leonor Figueiredo, Dalila e Álvaro Mateus, Américo Botelho, Júlio Magalhães e outros, que têm inundado com os seus livros sobre Angola o mercado livreiro, nada ou quase nada sabem da tragédia que se abateu sobre Angola e todos quantos lá viviam (angolanos e portugueses). Daí eu ter escrito que ""me dava "gozo" lêr os novos historiadores/romancistas que editam livros como cogumelos sobre Angola e o antes e depois, sem nunca lá terem estado e vivido as coragens, os medos, as angustias, os heroismos, as incertezas e a trágica demanda de portugueses e angolanos para um novo rumo, para uma nova pátria de acolhimento"". Mas garanto que não me doi lembrar, que não me doi escrever sobre estes momentos. Apenas escrevo aquilo que a qualquer momento decida escrever, sem outro motivo que não seja o de que fiquem registados neste meu "livro" de memórias. Tudo de Bom e agradeço as palavras amigas que vai deixando neste Reviver de todos nós. Saudações e Mungueno
Olá mano
Felizmente a vida refez-se por cá. O povo angolano nem com o que lá foi deixado ficaram melhores do que estavam, mas têm o país deles que também podia ter sido o nosso pois adorávamos tanto aquela terra vermelha como eles. Quando lá voltei já não me revi naquele amontoado de ruínas que ficou a "nossa" Luanda. Depois de tudo aquilo que aqui relatas, mais palavras para quê? Quando se for a nossa geração, mais ninguém se lembrará que um dia houve um país que o assobio não era só nosso, era de todos. Abraços
Olá mano,
Tal como referes os portugueses e milhares de angolanos saídos souberam, com maior ou menor dificuldade, refazer a sua vida noutros cantos do mundo. Era assim aquela nossa geração e a dos nossos pais que através do árduo trabalho soubemos edificar paises, criar cidades, vilas e aldeias. Soubemos fazer germinar do deserto o celeiro, a pastoricia e a agricultura e conseguiu-se que as tribos nómadas soubessem que também tinham um país e era preciso sedentarizarem-se, o que se conseguiu. Estiveste lá, viste o que viste e aquilo já nada é. Era, e é, um amontoado de ruínas com o povo miseravelmente na valeta dos despojos da nova elite reinante. A nova elite que os "libertou" do jugo do colono branco para os sujeitar atrozmente ao jugo do neo-colonizador negro, dos "libertadores". Este Mumpiozzo Ame é uma magnifica interpretação de Teta Lando e assobia para "esquecer", mas não esquece. Abraço
Olá Leão Verde,
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Estive a espreitar o seu blogue e vi o que aconteceu no Banco, sem comentários mas faço uma pequena ideia do que deve ter sido passar por isso. Eu trabalhava no Totta mas vim em 1975, felizmente. Inté << Home |