sábado, 25 de outubro de 2008

 

Encontro em Luanda


** Del Shannon - Runaway **


Este tema "Encontro em Luanda" é o que iria escrever no dia em que senti a necessidade física e emocional de escrever o “Adeus … AMIGA”

É um tema em que pretendo Relembrar um Momento Bom … o Momento de um Encontro de Amigos.
Um Amigo de tempos já há muito idos, mas neste Encontro regressados.
Um Amigo de há 47 anos, tendo como contagem o mês/ano em que escrevo este Reviver.
Pois foi em Outubro de 1961 que nos conhecemos.

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Luanda. Um dia de um mês qualquer do ano de 1969/70 (18/19 anos).

Bairro de S. Paulo. Rua do Lobito. O Sol já aquece a terra. Os despertares de uma cidade que não dorme sente-se no pulsar do bairro. Como habitualmente saio de casa por volta das sete horas. Caminho até à Rua do Vereador Prazeres (rua aonde anteriormente vivi), e apanho, frente à Casa Lisboa, o “maximbombo” linha 4-S.Paulo, rumo à Mutamba.
Centenas de trabalhadores, estudantes, donas de casa e pequenos comerciantes enchem e deslocam-se nas ruas daquele “meu” bairro.
Ao longe, o Mercado de S.Paulo fervilha de gente, de carrinhas e camions com abastecimentos de alimentos, produtos hortícolas frescos e onde se encontra de tudo um pouco.



O Bar Cravo, a Casa Lisboa, o Café Django e a mercearia já tinham os seus clientes habituais para o café matinal com “cheirinho” ou pura e simplesmente tomarem o “mata-bicho”. Era o povo anónimo a preparar-se para mais um dia de trabalho, de estudos, de canseiras.
Após espera na fila, chega a m/vez de entrar no “maximbas(*). Entretanto passa o da linha 4A (**), que tem o terminal na Rua dos Pombeiros, frente à vivenda da família Vidal (esposa Maria, as filhas São e Cândida e o filho Alberto). Penso que o Sr. Vidal tinha uma marcenaria mais ou menos ao lado da Padaria Palmela, frente à Gajageira.

nota explicativa;
(*) chamamos maximbas aos maximbombos, que eram os autocarros de "primeiro andar".
(**) devido à densidade populacional do Bairro de S. Paulo e da que a ele aglutinava, houve necessidade de se criar esta 2ª linha. O Bairro de S. Paulo era o único bairro de Luanda que tinha duas linhas de autocarros.

Após diversas paragens, eis-me chegado à Mutamba. Dezenas de autocarros e maximbas “despejam” centenas de passageiros que, apressados uns, mais descontraídos outros, se deslocam para os seus locais de trabalho,de estudo, ou simplesmente uma passeata até ao café mais próximo. Luanda tinha muita população flutuante.

Estamos ainda na época em que se pratica o horário da “semana-inglesa”, ou seja, 48 horas/semana. Nas oficinas o horário era 08H00/12H30; 14H00/18H00 e aos Sábados saía-se às 13H30.
Tinha que andar ligeiro, pois da Mutamba até à oficina do Sr. Brito, sita na Rua D.Francisco Soveral, mais ou menos por detrás do Baleizão, era um esticão e o tempo escasseava.

Percorro a Rua Sousa Coutinho (onde anos mais tarde trabalhei como oficial de diligências na 2ª Vara Cível de Luanda), passando pela Electro Minho, Charcutaria Francesa, Oculista Franco e viro na Saratoga para o Largo D. João IV.
Os pregões dos cauteleiros da Casa da Sorte e da Casa Campeão, e os dos ardinas do jornal “A Província de Angola” já se ouvem à distância. A pastelaria Versailhes, a Gelo e o Pólo Norte começam a ficar “abarrotadas” de pessoal em volta dos cafés, galões, dos bolos e demais pastelaria.

Fim de tarde, 18H00. Saio da oficina passo pelo Hotel Continental e Baleizão e caminho tranquilamente, sem pressas.
Observo o bulício das pessoas que passam após mais um dia de trabalho, observo a gente que observa e continuo a andar.
Talvez vá até ao Pólo Norte ou à Versailhes até fazer horas de ir ter com a minha amiga Lete que trabalha na Cabeleireira Ana Bolena, no 1º andar de um prédio sito na Avª dos Restauradores, logo a seguir ao Amazonas, prédio ao lado do prédio da Auto Avenida. “Isto de se trabalhar num cabeleireiro não dá para ter horário certo, na saída”.
A meu lado esquerdo e do outro lado da estrada ergue-se o prédio onde se lê em letras “garrafais” Alfredo F. Matos. No meu lado direito um largo que dá para a Rua Avelino Dias, onde anos antes trabalhei no Alfredo Alves Baptista, circunda um funcional e frondoso jardim.

** Avª Restauradores-prédio alto lado esquerdo-Alfredo F. Matos **


No sentido do meu andar e em sentido contrário continuam a circular centenas de pessoas. Um, de entre mais jovens, cruza-se comigo mais ou menos frente ao jardim do largo. Fixo por momentos o seu rosto, como mais um rosto, e prossigo. Uns passos mais à frente paro e rememoro aquele rosto que por qualquer razão me ficou na retina. E tive “quase” a certeza que não me era desconhecido, que me fazia lembrar alguém. Viro-me, mas já não vejo o jovem, que deveria ser +- da m/idade. Tinha desaparecido do meu campo visual. Olho mecanicamente para o relógio são cerca das 18H20.
Concluo que se quiser ter a certeza de aquele rosto ser de alguém conhecido, terei de no dia seguinte estar por aquele local dentro daquele horário, no pressuposto dele ser um trabalhador ou estudante e o horário estar condizente com a sua saída; morar por ali perto; de poder ir ter com alguma estudante do Colégio D. João II, por cima do Baleizão, ou coisa do género.

Assim, no dia seguinte fiz marcação cerrada ao horário, mas não o vi passar.
Não fiquei desalentado, tanto mais que aquele era o meu caminho diário e se ele tivesse que aparecer, eu por lá andaria. Já tinha feito um exercício de memória, mas sem resultados. Não sabia quem era, nem as circunstâncias em que o poderia ter conhecido para ficar com aquela “certeza” de o conhecer de algum lado.
No entanto sabia que se um dia o encontrasse não saberia o que lhe perguntar. Talvez lhe perguntasse o nome.
Mais uns dias se passaram até que de repente, e sem dar por isso, cruzamo-nos mais ou menos no mesmo local. Como foi de repente não tive tempo para fixar bem o rosto, mas o pouco que vi, aliado ao que da vez anterior me tinha ficado na retina, deu-me a certeza de que o conhecia. Já não havia o “quase”, era a certeza.
Olhei para trás, ainda o vi, e resolvi ir no seu encalço. Quem era, como se chamaria, de onde seria e outras perguntas do género percorriam o meu cérebro.
Mas estava decidido a fazer pelo menos uma daquelas perguntas. Chegado a ele toquei-lhe no ombro, vira-se com um olhar interrogativo, olho-o agora olhos nos olhos (o que ainda não havia acontecido) e de repente sai-me a pergunta:
- tu não és o José Maria Rodrigues Lomba!?

Talvez perplexo por estar a ser abordado por um jovem desconhecido que lhe diz textualmente o seu nome, o jovem responde que sim que é o José Maria Rodrigues Lomba. E de imediato pergunta e tu, que sabes o meu nome, quem és,!?
Eu ainda não estava em mim com o acontecido. Até ao momento de lhe tocar no ombro, ele virar-se, eu olhá-lo bem, eu não sabia quem seria, de onde o poderia conhecer, nem minimamente como se chamaria. E num repente saiu-me aquele nome, lembrei-me de onde o conhecia, de onde ele me conheceria também.
É evidente que à pergunta dele disse-lhe quem era, de onde era, de onde o conhecia, e naturalmente, após ter “rebobinado o filme da memória” começou a reconhecer-me e a corroborar o que eu estava a dizer a seu respeito.

José Maria Rodrigues Lomba tinha sido, no ano lectivo de 1961/1962 (10/11 anos,) meu condiscípulo no 1º ano da Escola Comercial e Industrial da nossa terra. Só lá nos havíamos conhecido, mas travamos bom companheirismo dentro do pouco tempo que frequentei aquele ano, Set./Out. de 1961, pois em fins de Fevereiro 1962 deixei Portugal rumo a Luanda/Angola«

E passados 7/8 anos encontramo-nos em Luanda, num dia de um mês qualquer do ano de 1969/70. Da forma que foi. Por mero acaso e pela minha memória fotográfica.
Logo ali retomamos o companheirismo e a amizade anos antes interrompida.
Pouco depois, e após ele ter internamente tratado do assunto, por estar ligado à área administrativa, fui trabalhar para o Alfredo F. Matos, representante das marcas Simca; Renault; M.A.N., Sumbean e Lótus Europa (devido ao motor ser da Renault)
Mantivemos essa amizade ao longo dos meses seguintes, tendo estado presente no seu casamento, realizado no dia 5 Dezembro 1970, na Sé de Luanda.

** no exterior da Sé **


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** eu a dar a tradicional tesourada na gravata **


Deixamo-nos de ver após eu ter mudado novamente de local de trabalho, pois era um autêntico saltimbanco, ter tido novas rotinas, a ida para a tropa, e o 25 de Abril que dispersou tudo e todos.
Nada mais soubemos um do outro. Alguns anos mais tarde cruzamo-nos novamente, agora Reencontrando-nos na nossa cidade, onde vivíamos e vivemos.
Mantemos hoje viva a chama da Amizade iniciada em 1961, retomada em 1969/70 e definitivamente reencontrada há alguns anos atrás.

Para ti, Amigo José Lomba, um Grande Abraço de Amizade

Saudações e Inté



Comments:
Oiiii, que bom manter a amizade e poder ver a pessoa lá na terra!...Ao falares nas nossas ruas nos maximbas, nos bares na Casa Lisboa,no mercado onde ia com a mãe quase todos os dias (antes de abrir o Suprema do pai da Ligia e do Franklim) comprar coisinhas boas, e ficou retido em mim o cheiro da ginguba a torrar, a batata doce a ser assda em latas, mas aquele cheirinho, ai nino nino... as goiabas, o caju com o fruto não só em castanha, as bananas boas, papaias, mangas, ai Deus e ué... ai rapaz, só avivaste a saudade... Aumentei a foto do casamento dele, vi-te,(estás à frente ou debaixo da palmeira é?) mas não reconheci mais ninguém... Que pena.
Um abraço saudoso de ti, e saudoso da terra!... da garota.
 
Saudade saudade, do mercado quantas vezes sem conta lá fui com a minha mãe e até sózinha, o peixinho tão fresquinho as
mangas o tambarino as bananas com aquele sabor especial que jamais voltei a comer, E as quitandeiras
com aquelas panos enrroscados no corpo e nas costas ás cavalitas os filhotes e o pregão delas
que saudade, o mercado já não hesiste. Para nós ficará uma dolorosa saudade
nos nossos corações

LAMEKING
 
bem haja
 
Cara Ermeli...,

Bem-vinda a este nosso canto de recordações.

Como reparará um seu anterior comentário não foi publicado e a razão deve-se ao facto de eu não publicar comentários que em certa medida não se enquadrem com o tema.
Dentro deste meu critério poderá efectuar os comentários que entender, podendo até deixar escrita uma sua estória, um seu momento, análogo ao assunto do tema que esteja a ler.

Devia-lhe esta explicação, face ao facto de ver publicado a citação acima e não o comentário que antes tinha deixado.

Aliás esta minha decisão está transcrita no tema "Reviver Estórias - o Blog" como poderá verificar ...
...Mas este “livro aberto” está receptivo a que o “ilustrem” com as v/estórias, as vossas vivencias, as vossas lembranças, mas dentro do espírito do próprio tema.
Um blog não é, nem pode, através dos comentários insertos, ser transformado num fórum, num chat, num Messenger. ...

Saudações e vá aparecendo
 
Num certo dia, talvez em 1969/70, "roubei" uma moto 125cc YAMAHA, preta, a um oficial de diligências da Rua Sousa Coutinho. Por acaso não foi a ti???
 
Ao ler o seu blog chorei de alegria por haver tanta gente saudosa da minha terra amada do meu colégio D. João II das minhas andanças por essa terra maravilhosa obrigada
 
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