domingo, 21 de março de 2010

 

Correr pelo Rival


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** Procol Harum - A Whiter Shade Of Pale **


O Único Clube que Oficialmente Representei


** 1970/19 anos **


Nascido no seio de uma família tradicionalmente Sportinguista [ver o tema Leão Verde – a Origem] é obvio que como filho mais velho absorvi todo esse fervor clubista e de sportinguismo puro, que ainda hoje mantenho. Mas, como quase sempre acontece em todas as famílias, existem sempre as “aves” raras a destoarem da “doutrina” implementada e assim os dois meus irmãos que a seguir nasceram não seguiram o estipulado :)) e guindaram-se para o reino das águias. Verificando o “perigo” meu pai lá deu melhor as injecções clubistas seguintes e os meus dois últimos irmãos recompuseram a linhagem traçada pelo meu bisavô e tudo voltou ao rumo normal. Faltava-me referir que minha irmã mais velha também é leoa. Já agora uma pequena incursão pela família na sua vertente clubista.

Assim meu bisavô paterno, meus avós paternos, meus onze tios paternos e cerca de quarenta dos cinquenta primos directos são do Sporting. Dos outros dez desconheço por falta de convivência.
Meus pais, eu e mais três irmãos do Sporting somos, sendo os outros dois do Benfica.
Minha irmã mais velha é casada com um Sportinguista e as filhas, genros e neto(a)s também do Sporting são. Até o cão que tinham em Luanda era “Sporting”. Eu, por “azar”:)) sou casado com uma Benfiquista, meu filho é do Sporting e minha filha, para equilibrar, é do Benfica.
Meu irmão Mario é uma das aves, sendo um dos filhos do Sporting e os outros do Benfica.
Alfa é a segunda raridade da família leonina. A sua descendente não tem cor clubista (que eu saiba).
Mana Faty leoa é, sendo o marido do Benfica, assim como um filho, mas os outros são Sportinguistas.
Por fim meu irmão Tony, assim como mulher e filhos são todos do Sporting.
Concluindo. Não pretendendo ser aquele ex-primeiro-ministro a quem um jornalista colocou uma pergunta estúpida (como se ele, jornalista, soubesse responder ou a resposta), a família vai, em linha recta, na sétima geração de Sportinguismo.
Poder-se-á dizer que meu bisavô paterno, um dos fundadores do Sport Clube/Sport Clube da Póvoa/Sporting Clube da Póvoa, sentir-se-ia por certo feliz por verificar que o seu clube continua a ser ramificado e idolatrado pelos seus descendentes.

** 1962. A Familia no cimo dos Combatentes **


Posto isto vamos à estória deste meu Relembrar
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Como se devem lembrar através do tema “Jogar à Bola” andei, com 18 anos, a treinar futebol no Clube Atlético de Luanda mas sem resultados práticos pelos motivos evocados no tema. Mas sendo um adepto da prática desportiva já antes tinha procurado enveredar por outra modalidade, o atletismo.

E é essa passagem que hoje trago a este Reviver Estórias
.

** 1963. Cruzamento do Quintas & Irmão **


Estaríamos talvez no ano de 1967. Tinha 16 anos e vivia na Rua do Lobito.
Em Angola só dois clubes portugueses dos chamados grandes eram conhecidos; o Sporting Clube de Portugal e o Sport Lisboa e Benfica. De forma mais discreta e muito restrita aparecia o Belenenses. Dessa realidade foram em devido tempo criados os vários Sportings e Benficas por toda a Angola. Em Luanda eram o Sporting Clube de Luanda (nos Coqueiros), fundado em 15 de Agosto de 1920 e tornado filial em 1922, o Sport Luanda e Benfica (inicialmente no Largo do Pelourinho, depois na Pinheiro Chagas), fundado em 1922 e que tinha como apelido “Leões de Luanda” … e esta hein!! e “Os Belenenses” com sede na Samba.
Só muito mais tarde é que o Futebol Clube do Porto começou a ser de alguma forma conhecido através da sua filial, o Futebol Clube de Luanda.
Na época e devido à distância entre Angola e a Metrópole nós, os mais jovens e adeptos do desporto, pouco ou nada ligávamos ao facto de irmos ver um jogo do nosso clube ou do clube de um amigo. Queríamos era estar presentes, queríamos confraternizar, conviver e depois no fim sempre se mandavam na galhofa umas bocas uns aos outros, caso o clube de cada um perdesse ou ganhasse.
Devido à amizade que ligava a nossa família à família Maia, que vivia no Bairro do Café na Rua Sá da Bandeira, próxima do gaveto com a Rua Silva Porto,

** Igreja da Sagrada Família **


nomeadamente com os filhos António, Chico, Cipriano, Zé (depois denominado na época de “bambino de oiro” pelo Rebelo Carvalheira, jornalista de “A Província de Angola”, devido aos seus dotes fantasistas e criativos para o futebol), e o kandengue João, fui, pela sadia amizade e camaradagem que nos unia e também pela prática do desporto pelo desporto, até à velhinha e precária sede do Benfica de Luanda que, como acima refiro, se situava no Largo do Pelourinho/Rua Avelino Dias. É obvio que apesar de tudo não me senti muito bem a entrar naquele “ninho”, mas como estava com boa companhia lá fui subindo as rangentes e velhas escadas até ao 1º andar. Entramos os cinco; eu, meu irmão Mário e os irmãos Maia, o António, o Chico e o Zé.
Enquanto o Zé e o Chico se encaminharam para a área do futebol, nós os três fomos até à secção de atletismo para a respectiva inscrição. Apesar de tudo creio ter ficado um pouco desconfortado por estar a preencher uma inscrição num clube rival do meu. Mas como a amizade prevalecia e a prática desportiva era o fim, lá devo ter “fechado” os olhos ao emblema e meti o “papel” (inscrição).

Caso haja vida para além desta nem posso imaginar como poderia estar naquele momento o meu bisavô pela “traição” que eu, como leão, estava a cometer.

Bom, adiante … fizemos as perguntas necessárias, disseram-nos como é que a secção funcionava (dias, horas, local de treinos e condições do equipamento). Tínhamos que levar as sapatilhas e calção, pois as camisolas a secção cedia.
No primeiro dia marcado aparecemos na sede, equipamo-nos e a correr dirigimo-nos para a pista de atletismo no Estádio dos Coqueiros.

** 1969. Aspecto parcial do Estádio dos Coqueiros **


Lá chegados e após os primeiros contactos com os treinadores sobre a razão de lá estarmos e o que pretendíamos, efectuamos os aquecimentos e alongamentos e depois demos algumas voltas à pista para o treinador aquilatar das potencialidades de todos quantos lá tinham aparecido como nós. Como se sabe o atletismo tem as mais variantes modalidades e os treinadores tinham que delinear as várias possibilidades dos “candidatos” a atletas. Treino após treino sei que eu e o António Maia fomos considerados inicialmente corredores de meio fundo e depois de fundo. Enquanto meio fundo dávamos entre duas a quatro voltas à pista para observação da nossa velocidade e resistência.
Depois passamos para treinos de fundo que poderiam ir até aos 10.000 metros, ou mais. Nestes treinos começávamos inicialmente com umas duas voltas à pista e depois saíamos para a Rua dos Coqueiros, rumo à estrada da Praia do Bispo até ao largo a seguir à igreja, passando pela Duarte Lopes e Francisco Soveral. Regressávamos novamente ao estádio para os alongamentos e exercícios finais e rumávamos até à sede para nos vestirmos.

** Pescador da Corimba **


Entretanto, com o decorrer do tempo, meu irmão Mário deixou de se sentir motivado para praticar a modalidade e recomeçou os estudos, assim como pouco depois o António Maia também abandonou (tinha ficado “prisioneiro” da dama e o tempo não dava para tudo), pois todos trabalhávamos.
Conclusão; eu, o Leão Verde, Sportinguista de geração, que tinha “traído” os meus ancestrais e que por amizade me inscrevi, fiquei sózinho no clube que em termos emotivos e sentimentais nada me dizia. Mas já que a prática da modalidade estava a ser uma realidade bem positiva, lá fui ficando e representando, dentro das minhas possibilidades e potencialidades o emblema da águia.
Passei, depois de algumas poucas provas de estrada e pista para o corta mato. A concentração era na sede, sendo depois transportados numa carrinha para a Maianga, onde no chamado Rio Seco treinávamos e tínhamos as provas de corta mato.
O tempo foi decorrendo, treinos e provas iam-se fazendo e disputando. Nos regionais qualifiquei-me para ir aos provinciais que nesse ano (1968) se disputavam em Nova Lisboa ou em Sá da Bandeira (não posso precisar). Provinciais esses que por motivos familiares/profissionais não os pude ir disputar.
Por via disso deixei a modalidade. E dediquei-me mais aos estudos já reiniciados na João Crisóstomo. Parar é que não era connosco.

** Miradouro da Lua **


Eu e Mario tínhamos que estar sempre a fazer algo, ocupando o tempo de forma útil. Tempo esse que para nós era vivido nas suas quase vinte e quatro horas. Como ainda hoje de certa forma vai acontecendo.

De nomes de outros companheiros de estrada, de treinadores, de seccionistas ou de outros não me lembro rigorosamente coisa alguma. Posso ter tido um “trauma clubista” que fez com que não os memorizasse :)).
O que digo é que tive prazer em representar o Sport Luanda e Benfica, pois o que sempre me interessou foi a parte desportiva e não o clube ser ou não o meu Sporting Clube de Lisboa/uanda.

Saudações e Inté



Comments:
Olá leo há quanto tempo. Fizeste-me lembrar algo muito parecido na minha juventude e de estudante. Sempre fui portista, mas tinha um amigo sportinguista que me levou a treinar atletismo e salto em altura nos coqueiros pelo Sporting. Foi por pouco tempo. O tempo não dava para tudo, para mais que quando tinha 16 anos pertencia aos bombeiros da cruz verde em frente ao cinema restauração e gramava aquilo à brava. Nas férias quando havia umas saídas para o interior de Angola, eu ia com o nosso reboque na recuperação de veículos acidentados. Mais tarde começaria a viajar também para a minha fazenda que ficava para os lados de Samba caju, na província cuanza norte, Dondo, Salazar, Lucala. Desculpa não tem nada a haver, mas isto faz parte da nossa história e da nossa juventude em Angola. Um abraço leo tem uma boa noite e enquanto poderes continua a contar as tuas estorias. È, lá longe no passado, Leo, há vida para além do tempo mesmo que esta não volte mais.
 
Olá Edu,
com a tua intervenção corroboraste o que escrevi sobre o facto de pela amizade e convivio não nos preocuparmos em representar qualquer outro clube que não o nosso (o de cada um).
E também demonstras que apesar de novos cada um à sua maneira gostava de se sentir util à comunidade, como referes sobre a tua participação na vida activa dos Bombeiros da Cruz Verde. Fazer e Praticar o Bem sem Olharmos a Quem.
Sobre o facto de descreveres pedaços da tua história e de mencionares locais daquela outra Angola, não há nenhum problema.
O meu Reviver Estórias é de todos nós, dos que leiam e queiram deixar a sua "marca" no tema aberto ao comentário. Dessas localidades só conheci, embora muito vagamente, o Dondo quando estive militarmente colocado na Muxima.
Um abraço
 
Olá mano

Enquanto tu corrias cá por fora eu fazia a pista.

Reparar pela imagem que já nessa altura o Estádio dos Coqueiros tinha pista onde nós praticávamos para além do meio-fundo, lançamento de dardo, barreiras e salto em comprimento.

A minha saída deveu-se a um litígio que tive com o treinador, pois queria a todo o custo que fizesse lançamento de dardo e eu não estava para ali virado.

No entanto é de salientar, é o facto de vestires a camisola de um clube que não o teu mas também te empenhares em o representar ao te teres qualificado para os provinciais. Sinal de que a vontade estava para além do cor do clube representado, pois seja no Benfica, no Sporting ou no ASA, todos merecem igual respeito.

E é desse respeito que se fazem os campeões, pois nem sempre o é quem sobe mais vezes ao pódium mas sim aquele que respeita e dá tudo pela camisola que veste.

Abraços!
 
Olá mano Marius70,

é bem verdade. Os Coqueiros já tinham as mais variadas disciplinas no que ao atletismo diz respeito.

Mas o teu treinador não soube ver em ti as potencialidades para a corrida e quis aumentar o nr. de praticantes para o dardo. E o teu Benfica "perdeu" um óptimo atleta para as diveras provas de corrida. Hoje ainda mostras a tua raça a esse nivel, quer em estrada, quer em trilhos de serranias.

Quanto à côr das camisolas representarem ou não o clube de cada um, não era esse o motivo impeditivo para que não houvesse empenho e dedicação. O importante era o respeito que tinhamos por nós, pelo nosso esforço em prol do projecto que abraçassemos, fosse ele qual fosse.

Um abração
 
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